sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

"... e de Louco todo mundo tem um pouco!"



Ciclos são fases, temporadas que podemos cronometrar, medir, avaliar objetivamente ou cientificamente e que acontecerão, de forma repetitiva, independentes da nossa vontade (estações do ano, fases da lua, ciclo menstrual, por exemplo) ou simbolicamente, cuja medida de avaliação é muito mais subjetiva (tornar-se adulto, casar, graduar, iniciar uma profissão, ter um hobby, etc).
Os aniversários, ainda que obedeçam uma sistema cronológico determinado (sempre no mesmo dia e no mesmo mês do nascimento), eles tem um valor simbólico muito mais profundo.
Se enquanto somos muito jovens o passar dos anos significa apropriar-se dos possíveis benefícios reservados aos adultos (poder votar, dirigir, assistir a filmes, peças, shows censurados a menores, viajar sozinho e sem autorização, ter seu próprio negócio), quando maduros podem nos lembrar da sutil, mas constante, aproximação de um outro final de ciclo, o da própria vida. Ninguém ou nada vivem para sempre. Os ciclos naturais também existem em medidas mais ou menos pré-determinadas para tudo o que conhecemos.
Mas o "fazer aniversário" é sempre uma celebração à vida, até mesmo para aqueles que dizem "esquecer" da própria data de nascimento. Conscientemente ou não, meticulosamente ou não, acabamos por fazer algum tipo de avaliação, de reflexão sobre o tempo vivido até então.
Passam pelos nossos pensamentos imagens muito antigas, da infância, de momentos marcantes pela alegria e outros pelo sentimento oposto; nos revemos em situações vividas anteriormente, com pessoas conhecidas e outras cuja imagem física parece ir-se diluindo em nossa memória.
Aproveitamos então as primeiras horas do dia para fazermos planos, promessas de novas atitudes, comportamentos, ações, para aquele novo ano que se inicia. Quase o mesmo ritual do réveillon, da passagem de ano, do 1º de janeiro, este também um ciclo criado como medida de tempo pelo ser humano. Por mais pessimista que possa ser o momento vivido pelo aniversariante, o simples fato dele estar completando mais uma volta, desde o seu nascimento, em torno do sol que ilumina nossa galáxia, só isso basta para trazer alguma esperança. Afinal, completou-se um ciclo e, por que não, começar de novo com tudo (ou pelo menos algo) novo?
No tarot, algumas cartas individualmente podem representar esse sentimento de completude e recomeço: o Julgamento (ou Juízo Final) e a do "arcano sem número", o Louco. Se no arcano XX (o Julgamento) somos convidados a ouvir o chamado para "renascer", com novas energias, esperanças e conhecimento, no Louco temos representado o arquétipo da criança, do inocente, no neófito, daquele que começa a sua jornada iniciática.


Esse título (Louco) vem de algo mais místico e nada tem a ver com a loucura registrada nos compêndios médicos ou qualquer deficiência de desenvolvimento mental ou, mesmo, de caráter. Estamos falando aqui daqueles que eram chamados antigamente de "loucos de Deus", daquelas criaturas que ainda não se deixaram contaminar pelos "pecados" do mundo, desconhecem as "regras do jogo", são puras em suas intenções e fazem o que fazem guiadas pela intuição. E, pergunto, o que é intuição senão um conhecimento que possuímos e que não foi ou é adquirido nos livros, nos bancos escolares, nas academias e templos, na educação regular e familiar, mas sim algo muito mais antigo, muito mais interiorizado. Uma forma de sabedoria "pré-instalada" (se me permitem a comparação) que cada um de nós possui, desenvolve e se utiliza se quiser, como quiser, onde e quando quiser.
Assim o Louco, autêntico representante de todos os começos, de todos os primeiros passos, primeiros momentos, primeiros dias (1º dia na escola, 1º dia de casado, 1º dia no novo trabalho, 1º dia na nova cidade, 1º dia de namoro, etc), de toda experiência nova que decidimos assumir, de todos os riscos que assumimos correr, inicia uma jornada que, em termos tarológicos, irá percorrer as demais 21 cartas e com isso todas as virtudes e vícios dos Arcanos que as representam.
Hoje, 31 de janeiro, representa o fim de férias para muitos e a volta à rotina, ao trabalho, à escola, aos amigos, à família. Ainda que tudo possa parecer, em muitos casos, um retorno à mesmice do dia a dia, ainda assim voltamos com energias renovadas, com conhecimentos adquiridos, com novas perspectivas, com um repertório de assuntos renovados. Vamos começar "de novo"!!! Estaremos tendo a oportunidade de nos posicionarmos nessa estrada com curiosidades por novas coisas, com vontade de nos dedicarmos a algo diferente, sem precisarmos manter compromissos com opiniões, vínculos e atitudes que já se provaram caducas, que já estão com seu prazo de validade vencidas, que já nos acompanharam boa parte do caminho mas que agora já não se fazem mais necessárias.


É hora de celebrar mais um aniversário: o da "Nova Oportunidade", o do "Novo Dia", o do "Novo Começo", lembrando sempre que não há como apagar o passado, mas sempre se pode desenhar um futuro novo e brilhante. Para tanto basta fazermos uma reflexão sobre o que passou, assumirmos e aceitarmos os acertos e erros cometidos e, com essa experiência adquirida somada à intuição, abrirmos nossa mente, coração e espírito, para a aventura que agora começa: sermos "loucos de Deus" a construir o nosso próprio Destino.


(ao amigo Victor Cossini)

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Arcano 5 - Hierofante: O Mestre



O Hierofante, um nome menos associado à Igreja Católica, como o Papa, e muito mais próximo à condição "sacerdotal" desse arcano, é sempre uma interessante presença numa leitura de tarot.
Gosto, particularmente, de meditar a respeito dela. É forte, dinâmica, e representa algumas qualidades que muito admiro nas pessoas: a cultura, o saber adquirido, o foco numa especialidade sem perder a noção do todo, a forma organizada de expor os pensamentos.
Entendo o porque, quando leio que na China de antigamente, apenas ao imperador e os professores era permitido o uso da cor amarela nas vestes, simbolizando o poder material (ouro) e a sabedoria (a luz solar). Ter conhecimento e saber transmitir é um dom e um privilégio.
Arcano IV, o Hierofante (ou Papa, ou Sumo Sacerdote) simboliza todo aquele a quem recorremos quando precisamos de um conselho, uma orientação, um esclarecimento, um parecer, uma opinião que sabemos, de antemão, confiável. Representam pessoas de reconhecido saber em alguma área específica ou, até mesmo, aqueles cujos conhecimentos são amplos, variados, diversificados. Personagem renascentista, Leonardo DaVinci é um desses exemplos, pois excede o comum, em termos de talentos natos e desenvolvidos, atuando como artista, como cientista, inventor e tudo num altíssimo grau de realização técnica e investigativa, bem como qualidade artística.
O engenheiro que dá o seu parecer sobre uma edificação, o jurista que é consultado sobre os méritos de uma causa, o historiador que é procurado para contextualizar movimentos populares e políticos, o crítico chamado para comentar e qualificar uma determinada obra, o médico especialista altamente recomendado para tratar de um determinado distúrbio, o líder religioso de uma comunidade que encaminha seus seguidores numa busca iniciática, todos são exemplos de pessoas e atividades que podem, em determinados momentos, serem equiparados à figura do Hierofante.
Todos esses profissionais ou pessoas que gozam de reconhecimento e alto conceito na comunidade ou no meio em que transitam, são portadores e distribuidores de conhecimentos, tradições e saberes fundamentais para o bem estar físico, mental, emocional e espiritual daqueles que os buscam.



Mas, como sabemos, todas as cartas do tarot, assim como todos os arquétipos que conhecemos, tem 2 lados, os quais classificamos como positivo e negativo.
Os aspectos menos louváveis dessa carta podem ser descritos como: inflexibilidade, preconceito, síndrome do "eu sei tudo", uma forma ditatorial de impor seus conceitos e sua maneira de pensar. É também aquela figura execrável que, valendo-se da fama, da popularidade ou do poder, acaba criando uma ideologia dominante, desrespeitando a liberdade natural dos seres humanos de conhecerem, estudarem, pensarem, escolherem o que é melhor para eles, individualmente.
Exemplo clássico de um Hierofante "mal posicionado" ou "invertido", é a massificação produzida pelos programas televisionados. É a verdade deturpada ou omitida, a baixa qualidade dos programas de entretenimento, a falta ou má qualidade técnica e pedagógica dos programas educativos, a histeria coletiva incentivada por proprietários e diretores de canais de televisão (poderíamos incluir os jornais, as revistas, estações de rádio, páginas da internet, etc) que acabam por capturar o interesse do público e manipulá-lo a seu bel prazer.
O monge Rasputin colaborou para o fim trágico do regime czarista, com sua mística influência e seus desregrados excessos sobre a nobreza regente; países cujo governo é realizado por religiosos cuja ortodoxia impede a evolução cultural e social da sua população, mantendo-a numa eterna Idade das Trevas; blogueiros e propagadores de inverdades pela internet, manipulando fatos e dados que, eles sabem, nunca serão consultados pela grande maioria dos seus leitores, causando um estado de permanente insatisfação; "formadores de opinião" que, em troca de 30 moedas, vendem sua alma para convencerem seus absolutamente tolos seguidores de que isso ou aquilo é que é bom, de que tal e tal produto não podem faltar na vida de qualquer pessoa feliz, que esta ou aquela marca é que faz com que você se destaque na multidão e ganhe o respeito alheio...
Diferente da carta da SACERDOTIZA (Arcano II), que simboliza um saber guardado a sete chaves, um conhecimento que vive nas profundezas do inconsciente, que também pode ser o conjunto de saberes de um determinado grupo, culto, seita, clube ou associação, o HIEROFANTE é o saber aprendido e compartilhado. É a informação adquirida e passada adiante. É, portanto, quem instrui, educa, fornece subsídios de conhecimento, de maneira bastante liberal, a um grande número de pessoas.
Sempre que possível, devemos ao encontrá-lo no jogo, procurar pensar em como estamos manipulando nosso conhecimento, nossos saberes, nosso aprendizado, e em como estamos facilitando o acesso aos demais a essas nossas habilidades e níveis de informação.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Dez de Paus


Às vezes somos acometidos por uma síndrome que eu chamo de "deixa que eu faço". Faz parte de um certo complexo de "mais competente que eu, ninguém". E esse é quase sempre o primeiro sintoma de um muito provável final não muito feliz.
Sobrecarregar-se de trabalho, de obrigações, de compromissos, no intuito de mostrar-se altamente capaz, ou onipresente, acaba sendo um distúrbio compensatório de uma série de insatisfações, inclusive consigo mesmo. Uma tentativa de provar-se maior, melhor, mais competente do que os demais. Um grito de socorro pedindo por admiração, reconhecimento, elogios e o aplausos.
Claro que há ocasiões que não buscamos essa sobrecarga de afazeres e que as mesmas nos são impostas por razões e situações as mais diversas. Ou é um colega de trabalho que adoece ou sai em férias, ou porque o motorista não pode vir e temos que levar e buscar as crianças na escola, fazer compras no supermercado, pagar contas e fazer saques e depósitos no banco etc, tudo num mesmo dia, além, é claro, das nossas obrigações normais, profissionais, ou então porque é período de festas natalinas e a loja em que trabalhamos está "bombando" com clientes, pedidos, vendas, reposição de mercadorias, horários ampliados, etc.
O 10 DE PAUS é a carta que simboliza, com muita frequência, a estafa que sentimos ao final de um ciclo em que tivemos que nos multiplicar em muitos para dar conta dos afazeres. Há, sim, a satisfação do dever cumprido, do trabalho realizado, mas acompanhada de um esgotamento físico e mental.
Existe sim, a possibilidade de estarmos satisfeitos com o resultado do nosso empenho redobrado na execução das tarefas, e nas recompensas em forma de compensações e elogios pela nossa capacidade, mas... a que preço?

Naturalmente há pessoas mais ativas, mais dinâmicas, mais determinadas que outras. E também pessoas que podem ser chamadas de "workaholics", cuja vida pessoal praticamente inexiste e que se realizam (ou acreditam se realizar) única e exclusivamente através do trabalho. Há também aqueles que consideram que o lazer e o descanso, os momentos dedicados a si mesmo, a relaxar, são desperdícios. Todas elas, em comum, conscientes ou não, podem acabar sofrendo de alguns distúrbios ocasionados pelo excesso de atividades e responsabilidades.
Ser eficiente, competente e responsável não significa abrir mão do conforto e bem estar, da tranquilidade e do tempo a ser dedicado ao chamado "ócio criativo". Nem é motivo para compensar frustrações de origens diversas, punindo-se com algum tipo de sacrifício.
Portanto, quando o 10 DE PAUS surge numa tiragem de tarot, ele pode estar emitindo um sinal de alerta para que repensemos o quanto nos esgotamos e estamos esquecidos de encontrar prazer nas nossas obrigações, nos nossos afazeres. É hora de lembrar, com sincera modéstia, que ninguém é perfeito, nem insubstituível e que competência e qualidade não são exatamente sinônimos de excesso.