sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Arcano do Dia: A FORÇA



A FORÇA, Arcano XI (ou VIII, como preferem alguns) do tarot, é a carta da Coragem ou, como diziam os mais antigos, da Fortitude.
Quando pensamos sobre virtudes, ou seja, aqueles atributos fundamentais que nos dignificam como seres humanos e que se contrapõem aos vícios, entre as 4 virtudes chamadas Cardinais (orientadoras) e que polarizam todas as demais qualidades humanas, está a Fortaleza (ou Fortitude). E o que exatamente significa, que espécie de qualidade essa virtude representa?

Desde os primeiros proto-tarots conhecidos, aqueles baralhos com um número muito superior às 78 cartas do tarot como o conhecemos e usamos, encontramos essa figura. Apoiando uma coluna que tomba, ou próxima a uma fera (leão), ela traz a figura de uma elegante mulher, de traços delicados, expressão tranquila, vestida com trajes clássicos e leves, muitas vezes com uma tiara de flores nos cabelos, permitindo ao observador formar a sua própria ideia a respeito dessa virtude.
"Eu tenho a Força!", frase/bordão celebrizada pelo personagem "He-Man" nos quadrinhos e desenhos animados, deveria ser o mantra a ser recitado por todos aqueles que meditam contemplando a carta da FORÇA, ou mesmo por aqueles para quem ela surge numa tiragem de tarot.
Coragem, atitude, autocontrole, domínio, acreditar em si mesmo, ter fé num ideal são algumas qualidades dessa virtude e dessa carta. A FORÇA é aquela característica que observamos em alguma (poucas, infelizmente...) pessoas de não perderem nem o controle de si mesmas, nem da situação, mesmo quando o caos se instala em suas vidas ou ao seu redor.

Representa um equilíbrio conseguido através de um grande esforço. Por isso mesmo a figura feminina que simboliza essa virtude é sempre aparentemente frágil mas forte e corajosa o suficiente para impedir a queda de uma coluna de pedras ou que um leão a ataque. Não é o equilíbrio proposto, por exemplo, pela TEMPERANÇA (Arcano XIV) que é mais sutil, mais espiritual; nem aquele proposto pela carta da JUSTIÇA (Arcano VIII), que é cerebral, racional, frio. Na FORÇA somos impelidos a nos superar em nossos temores e fraquezas humanas. Somos convidados a controlar os nossos instintos, a dominar os nossos impulsos mais primitivos.

Quando essa virtude está presente em nossas vidas sabemos a hora de falar e de calar, de agir e de parar. Sabemos que não precisamos comer uma caixa de bombons para nos satisfazer e que 1 apenas basta. Sabemos que devemos praticar algum tipo regular de exercício (sempre sob supervisão médica) e que, para tanto, vamos ter que derrotar a Preguiça (um dos vícios). Quando vivemos a energia que essa carta representa, temos força e comprometimentos para abandonar os vícios, os maus hábitos, parar em definitivo com tudo o que prejudica nossa saúde ou discernimento, como o cigarro, o álcool, os medicamentos estimulantes ou tranquilizantes.
Além desses exemplos bastante corriqueiros, podemos dizer que estar vivendo as qualidades da FORÇA é quando defendemos, SEM "unhas e dentes", nossa maneira de pensar, nossas ideologias, nosso partido político, nosso candidato, nossa opção religiosa, nosso time predileto, nosso gosto musical. Tudo aquilo, enfim, que fazemos de forma controlada, equilibrada, sem excessos, sem exageros, sem extravagância, sem nos deixar levar pelas emoções, pelo "calor" da discussão, sem querer impor nada a ninguém, atesta o fato de nos conhecermos tão bem que, mesmo diante dos desafios mais grotescos, das agressões, das situações desequilibradas, continuamos íntegros.

Experimentar as qualidades contidas no conceito FORÇA é, antes de mais nada, ser civilizado. É saber abster-se de reações mercuriais, de atitudes descontroladas e intempestivas, de saber quando e como falar e também saber quando calar e ouvir, nunca provocar ou desafiar, de defender tudo aquilo que acredita com entusiasmo e ponderação. É saber respeitar o outro na sua totalidade. Isso implica na famosa e tão pouco praticada filosofia da "não agressão" pregada pelo líder indiano Gandhi.
A FORÇA é uma radiografia da real capacidade do indivíduo no seu viver em sociedade e na forma de interagir com o seu semelhante e tudo o mais o que compõe o seu entorno, o seu universo. É a consciência que sob estresse, sob a influência de determinadas circunstâncias, ou de medicamentos, de drogas, e mesmo por distúrbios neurológicos ou psicológicos podemos dar vazão a uma agressividade (seja ela na forma de violência física, nos abusos verbais, nos excessos sexuais, nos descontroles alimentares, na apatia, no estado depressivo, etc) primitiva, que carregamos em nossos genes desde tempos imemoriais.
Vivenciar as melhores qualidades exemplificadas na carta da FORÇA é tomar consciência dos nossos medos, temores, angústias, delírios, agressividade, vícios, dificuldades específicas, da possibilidade de sermos ofendidos, derrotados, humilhados, preteridos, vencidos e, ainda assim, mantermos o espírito elevado e a fé em nosso potencial. É ter domínio sobre a fera (os instintos mais brutos, mais primordiais) que existem desde sempre em nós, não deixando que eles dominem a nossa capacidade de raciocinar, de avaliar, de julgar, de empatizar, de perdoar, de amar. Não é, em nenhum momento, viver na passividade, no conformismo, na omissão, olhando a vida de longe, de forma anêmica. Não é ser covarde: é ser sábio, sabendo canalizar e utilizar toda essa energia para atos mais autênticos, sensatos, elevados, dignos de atenção, e não fazer da própria vida o ringue de um clube de luta.


O Arcano XI nos ensina que podemos dizer não com firmeza, expressarmos nossas opiniões e pontos de vista sem abusar e magoar. Que podemos argumentar sem ofender. Que podemos reclamar os nossos direitos apenas mantendo o foco num ponto de vista lógico, válido, digno, equilibrado, civilizado, não dando a chance ao opositor nos desorientar e perder nossa linha de raciocínio e autoridade sobre a questão. Escapar, terminantemente, da expressão "olho por olho, dente por dente", pois isso, realmente, só vai acabar numa enorme população de cegos e desdentados.
A FORÇA nos aconselha a não sermos destrutivos ou autodestrutivos, mas íntegros, senhores de nós mesmos, carismáticos, sabendo manipular e direcionar nossas energias com sabedoria, de maneira razoável, corajosa, confiante, controlada porém plena, a fim de obtermos os resultados pretendidos, sempre dentro de um meritório caminho evolutivo.
O escritor alagoano Graciliano Ramos nas páginas finais do seu livro "Caetés" coloca o personagem principal fazendo essa brilhante reflexão sobre a nossa condição de "humanos civilizados" diante de qualquer adversidade:

"Não ser selvagem! Que sou eu senão um selvagem, ligeiramente polido, com uma tênue camada de verniz por fora? Quatrocentos anos de civilização, outras raças, outros costumes. E eu disse que não sabia o que se passava na alma de um caeté! Provavelmente o que se passa na minha, com algumas diferenças. Um caeté de olhos azuis, que fala português ruim, sabe escrituração mercantil, lê jornais, ouve missas. É isto, um caeté."

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